Com base em decisão polêmica do TCU, ao menos cinco conseguiram vaga, entre eles um ligado à família Sarney
Publicado:19/01/13 - 18h58
BRASÍLIA - O Tribunal
de Contas da União (TCU) mudou seu ponto de vista sobre a Lei 8.112/90, que
trata do regime jurídico dos servidores da União, e autorizou que funcionários
não concursados passem a ser efetivados nos quadros permanentes do serviço
público como se tivessem prestado concurso público. A decisão dos ministros é
contrária às recomendações da área técnica do próprio TCU, à manifestação do
Ministério Público e até mesmo a decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).
Com a nova
manifestação, funcionários não concursados do Superior Tribunal Militar (STM),
do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de algumas regiões e do Senado pegaram
carona e conseguiram se efetivar. O caso mais recente se deu em dezembro do ano
passado no Senado, quando Humberto Coutinho de Lucena Júnior, filho do
ex-presidente do Senado Humberto Lucena (PMDB-PB) foi efetivado. Ele trabalhava
como comissionado desde abril de 1984. Em 2011, Lucena Júnior já havia tentado
se tornar efetivo.
No Senado, O GLOBO
identificou pelo menos cinco casos semelhantes, entre eles, Walter Germano de
Oliveira, ligado à família Sarney — ex-secretário parlamentar da ex-senadora e
atual governadora do Maranhão Roseana Sarney (PMDB). Oliveira foi efetivado em
22 de dezembro de 2010 como assistente técnico, no final do mandato da
legislatura anterior do senador José Sarney (PMDB-AP), que presidia a Casa.
Assim como Lucena Júnior, Oliveira tentou a efetivação em janeiro de 2005. Mas
teve sua pretensão indeferida.
A efetivação agora
desses servidores tem como motivação sobretudo o direito que passam a ter de se
aposentar com salário integral do serviço público — em alguns casos, cerca de
R$ 20 mil mensais, um direito que passará para os cônjuges quando o funcionário
falecer.
A mudança de
entendimento do TCU foi motivada por uma consulta realizada pelo STM em 2008 e
julgada em outubro de 2010. Os técnicos do TCU sugeriram o arquivamento da
consulta porque o próprio tribunal já havia se deparado com casos semelhantes e
havia se manifestado contra. Segundo os técnicos, a consulta ainda contrariava
o regimento interno da Casa porque tratava de uma questão interna do STM. O
relator Augusto Nardes, porém, menosprezou essa circunstância.
O STF também
havia se manifestado, em outras ocasiões, pela impossibilidade das efetivações.
Mesmo assim, prevaleceu, com o voto de cinco ministros do TCU, o entendimento
de que não concursados que atuavam no serviço público antes da promulgação da
Constituição de 1988 poderiam ser efetivados.
Relator se vale de argumento que atendeu ao TRT
A mudança de postura do
Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a transformação de empregos sem
estabilidade em cargos efetivos ocorreu porque o relator Augusto Nardes
valeu-se de um argumento do então ministro da própria Corte, Bento José
Bugarin, que atendeu aos interesses de servidores do Tribunal Regional do
Trabalho da 10ª Região. Os funcionários não se conformavam com as reiteradas
posições do TCU que lhes negava a estabilidade no serviço público.
Bugarin, informa o
relator, recebeu em seu gabinete os recorrentes e disse ter visto com outros
olhos o pleito que faziam. A partir de então, por uma questão semântica,
entendeu que o assunto não era regulado por normas trabalhistas, mas também
administrativas, que, segundo disse, precisavam ser analisadas com “outras
disposições legais de direito público”.
Justificativa com Decreto
Para justificar a
adoção da efetivação, o relator recorreu ao Decreto 77.242/76 — que tinha como
base a Constituição de 1967 — e que, em seu artigo segundo, parágrafo terceiro,
trata de gratificação de representação. Para o revisor do processo, o ministro
José Jorge, a Constituição de 1988 deixou claro que só pode ascender ao serviço
público, com direito a efetividade, aqueles que forem aprovados em concurso
público. A outra forma é ser nomeado em cargo em comissão, onde o administrador
pode exonerar o funcionário quando quiser.
José Jorge lembra que
nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, os constituintes
deixaram claro que somente teriam direito ao benefício da efetivação aqueles
que estivessem em exercício na data da promulgação da Constituição e contassem
com ao menos cinco anos continuados de trabalho na administração pública. E
deixou claro que a efetivação não se aplicava aos ocupantes de funções
comissionadas.
Apesar de o acórdão do
TCU determinar que passam a ter direito à efetividade servidores que mantiveram
vínculo ininterrupto com o Senado, há pelo menos um caso em que isso parece não
ter ocorrido. A servidora Denise Scarassati Marques ingressou na Casa em 7 de
dezembro de 1984. Porém, em fevereiro de 1985, requereu o pagamento do salário
e teve o pedido indeferido porque, segundo a diretoria do Senado, havia
começado a trabalhar em janeiro daquele ano — o que demonstra que ficou, pelo
menos, um mês fora do expediente.
O GLOBO enviou, na
quarta-feira passada, e-mail para a assessoria de imprensa do Senado
questionando esse caso, mas, até o fechamento desta edição, na noite de
sexta-feira, não havia recebido resposta.
Obs: Publicada matéria
semelhante com o titulo de TRENZINHO DA ALEGRIA na capa do jornal Correio do Povo do RS em 19/01/2013.
Colaboração de Luis Carlos Bueno Pereira da Silva